terça-feira, outubro 27, 2015

Angela

Fez ontem 81 anos. Mas faz nove anos que comecei, sem saber, a perdê-la. Passei ontem por baixo do apartamento que, no meu coração, ainda é dela. Cada passo na Avenida da Liberdade traz-me uma nova memória. Os caracóis cheios de laca que me deixava fazer na cabeleireira sempre que ia com ela. As roupas da mala vermelha, vindas de África, nunca mais usadas: a saia preta, que me dava pelos pés, e que me fazia sentir uma cigana que viaja pelo mundo. Assim me faziam sentir as noites passadas em casa dela: a viajar pelo mundo.

As valsas que me ensinava a dançar no "quartinho", vindas do móvel que hoje descansa na minha garagem, com vinil em cima e cassetes por baixo. As tunas, em castelhano. Esta música, "Silencio", do Ibrahim Ferrer, cantada por uma tuna de Santiago de Compostela, numa gravação em cassete que ela guardava. Acho que a fazia sentir-se em casa. E hoje, ao ouvi-la, faz-me sentir a mim. Em casa dela.

segunda-feira, outubro 12, 2015

A Pausa é um direito

Claro que tinha que arranjar uma boa desculpa para não cumprir nada do que me propus a fazer. Zero de disciplina (quanto a isso posso adiantar já o valor na escala deste assunto!). Mas, a meu favor, tenho uma dura e longa campanha eleitoral às costas.

Se da última vez que vos escrevi vos dava nota de escrever uma ou outra nota de imprensa (passe a repetição), posso agora confirmar que foram centenas desde Julho até ao início deste mês. Para além das centenas de visitas a hospitais, escolas, associações desportivas e agrícolas, produções de vinho e de leite, feiras semanais, feiras do gado e da terra e de artesanato, mercados...E entretanto não consigo nomear mais nenhuma área em específico porque a minha cabeça dá um nó sempre que o tento fazer. Claro que não faltaram empresas - com muitos ou poucos trabalhadores a sair e a entrar, outras que encerraram portas com salários em atraso.

quarta-feira, agosto 05, 2015

Três meses depois

Escrevo com um atraso significativo relativamente à periodicidade com que o devia fazer. Podia dizer-vos que este não é o único sítio onde escrevo - e que podiam descansar os que acham que a disciplina de escrever está ao nível de todas as outras - mas estaria a mentir; portanto assumo: escrevo muitas coisas noutros formatos (excluindo uma lista de compras, vai daí não ser nada prática nos supermercados) mas não escrevo escrevo. Significa então que fiquei - mesmo - este tempo todo sem escrever. À excepção de um pequeno texto que partilhei no facebook por altura do meu aniversário - mas isso já foi o mês passado. Quem sabe depois acabo por o partilhar aqui.

Escrever escrever é, de facto, uma disciplina. Aprendi já há muitos anos que a vida adulta requer uma dose extremamente alta de disciplina em tudo o que se faz. Mas como sempre detestei andar por balizas fixas sem poder respirar, hoje tenho que me forçar muito (muito) para conseguir impor alguma nos meus dias. Devia ter ouvido mais o meu pai quando me dizia "primeiro os deveres, depois as outras coisas", Mas eu sempre comecei pelas outras coisas...e sempre deixei os deveres para o limite do "agora tem mesmo que ser".

terça-feira, junho 16, 2015

Dia treze de junho de dois mil e cinco

Quis escrever-vos no dia certo. Mas o cansaço do quotidiano fez com que passasse a data. Há dez anos - estudava eu no ensino secundário - acordei com a rádio no despertador, como habitual. Hora de notícias. Meio a dormir, pensei ouvir ainda acerca da morte do Vasco Gonçalves, que tinha assombrado o fim-de-semana anterior.

Era segunda-feira e só alguns segundos depois percebi que se tratava do Álvaro, e já não do Vasco. Demorei mais alguns segundos a processar a informação. O Álvaro tinha morrido.

Era já militante da Juventude Comunista Portuguesa, mas nunca conheci o Álvaro. Ao contrário de dezenas de pessoas que conheço, nunca o vi. Nunca me cruzei com ele em nenhuma iniciativa, não tenho fotografias em criança a cumprimentá-lo - nem sequer sabia quem ele era enquanto fui criança.

Não me lembro dos debates na televisão e cresci sem saber sequer o que era o PCP. O que conhecia, então,  dele, e o que conheço, hoje, são fragmentos do que me contam, do que li sobre, dos tantos registos fotográficos e do que li dele. Não bastará para conhecer alguém, mas há alguns que podemos conhecer apenas dessa forma.

terça-feira, maio 26, 2015

O presente é sempre uma seca

Já vos aconteceu ter sempre saudades de tudo o que já passou e achar que o dia-a-dia é uma seca? Pois bem-vindos à minha sensação nostálgica. Desde de pequena que vivo agarrada aos momentos. Lembro-me de ir de férias e ficar com saudades de casa, e estar quase a voltar já com saudades das férias.

Sempre foi um sentimento chato; mas começou a ser mais difícil de gerir a partir do momento em que tudo passou a ser passível de nostalgia e saudade. Não só a empanada de atum que me sabia melhor que a vida no restaurante da Eva em Sanxenxo, ou as brincadeiras com os meus pais.

Passei a ser profundamente marcada pela sensação de estar constantemente a perder coisas pelo caminho. Em especial e mais fundamental do todas: um bocadinho de mim em cada ano, em cada mês, em cada momento que pudesse ter um título próprio.

quinta-feira, maio 21, 2015

Das conversas públicas

Quem me acompanha no facebook sabe que um dos meus assuntos preferidos para partilha são as minhas experiências nos transportes públicos colectivos. Mais especificamente - e porque são os únicos que utilizo numa base diária - os transportes urbanos de Braga.

Ora hoje lembrei-me que, dado que tinha começado um blog, convinha não o enterrar logo após o primeiro sinal de vida. Assim sendo, pensei ainda dentro do autocarro que me leva até às costas da minha casa (certo, tenho uma paragem que consigo ver pela janela do quarto - o que mesmo assim não me impede de volta e meia perder a carreira por míseros minutos) que hoje devia partilhar convosco a conversa que ouvi enquanto ainda aguardava na paragem (situada, ao contrário da minha, no que todos os que vivem pelo menos a 2 minutos do centro chamam de "a cidade").

O que começou por ser uma conversa que parecia inofensiva e que partiu de um comentário de uma das senhoras habituais no autocarro das oito, que notava que uma outra vinha mais tarde do que o habitual, terminou com as minhas veias a tentarem escapulir-se pela pele do meu pescoço.

segunda-feira, maio 18, 2015

Dia Um

Se tivesse comentado com alguém que ia criar um blog para partilhar o que me vem à cabeça sobre os meus dias, diriam que estava desactualizada.

Se já tenho facebook, uma conta no twitter que nunca uso e uma conta bloqueada no instagram, para que precisaria de um blog? A não ser que fosse um blog especialista em alguma coisa (ou se fosse o ano 2000), tinha a ideia justificada.

Mas como nenhuma das duas opções acima mencionadas são válidas, explico-me. Partilho muitas coisas no facebook. Algumas com interesse e outras sem relevância absolutamente nenhuma - como a maior parte das pessoas, estou em crer. No entanto, no facebook eu sou eu. E quando escrevo sei - embora com alguma margem para erro - para quem o faço. Estão lá os nomes e as fotografias para o provar. E partilhamos todos, ainda, o facto de termos muito pouca paciência para ler muito no facebook.

O admissível é um comentário engraçado ou a legenda da fotografia ou do vídeo ou do GIF (sim, eu sou das adeptas dos GIFs) ou do artigo que partilhámos. Uma ou outra opinião mais desenvolvida dentro do universo de quem quer partilhar opiniões. Mas não mais do que isto.